O aumento das queimadas no Pantanal já atinge níveis históricos de destruição da fauna e da flora.

 

N°06/20

Síntese: A partir deste mês esse espaço contará com a publicação de dois informes mensais sobre o monitoramento dos temas de destaque na questão agrária e ambiental. Nesta primeira quinzena de setembro, abordamos dois temas centrais: o aumento do preço dos alimentos, com especial atenção ao arroz, e o aumento das queimadas no Pantanal, que já atinge níveis históricos de destruição da fauna e da flora.

 

Preço dos alimentos em alta

No início do mês de setembro foram detectados aumentos significativos nos preços dos alimentos, com destaque para o arroz, com sacos de 5 Kg atingindo os valores de R$ 40,00 em algumas regiões. Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA/Esalq/USP), o acumulado em 12 meses chega a um aumento de 100% no valor do cereal, e a perspectiva é que os preços continuem em alta nos próximos meses.

Frente a essa situação, em um primeiro momento o presidente Jair Bolsonaro reagiu pedindo “patriotismo” aos donos dos supermercados para reduzir suas taxas de lucro em relação aos produtos alimentícios, em especial o arroz. “Estou pedindo um sacrifício, patriotismo para os grandes donos de supermercados para manter na menor margem de lucro”, declarou Bolsonaro.

Diante do fato de que o aumento dos preços não tem relação com qualquer sentimento pátrio, o governo decidiu isentar tarifas de importação de uma cota de 400 mil toneladas até o final deste ano; o volume corresponde à 35% das importações de arroz projetada pela Companhia Brasileira de Abastecimento (Conab) para 2020.

O aumento do preço do arroz tem muitas origens. Conjunturalmente, há a desvalorização do câmbio brasileiro; o dólar elevado aumentou as exportações do grão, já que este cenário deixa mais vantajoso para os produtores vender em dólar do que em reais no mercado interno. De fato, as exportações brasileiras de arroz beneficiado cresceram 260% entre março e julho deste ano, o que representou um volume exportado de 300 mil toneladas.

Outro fator de destaque para o aumento dos preços foi a redução da área plantada com arroz no Rio Grande do Sul, principal produtor do cereal no país. No estado, houve uma redução de 15% na área plantada na safra 2020 em relação ao período anterior; consequentemente, a produção também teve uma queda de 19%, com uma redução de quase 2 milhões de toneladas da última safra para esta (7,3 milhões de toneladas frente aos 9 milhões de toneladas no ano anterior). Outro dado importante é a redução do número de produtores no estado, que caiu de 9 mil para 6 mil produtores nos últimos 10 anos.

Os estoques do produto também apresentaram reduções significativas nos últimos anos. Segundo o Instituto Rio Grandense do Arroz (IRGA), na última década os estoques do produto caíram 80%. Há 10 anos, segundo o IRGA, eram estocados no entressafra 2,5 mil toneladas, enquanto que nesta temporada o estoque ficou em 500 toneladas. Não obstante, vale destacar que o projeto neoliberal aprofundado durante a década de 1990 desmontou a capacidade do Estado de formar estoques reguladores dos preços dos alimentos. Atualmente, a maior parte da capacidade de armazenamento no país está nas mãos das grandes empresas, inclusive as corporações transnacionais.

Além do arroz, o feijão também registrou altas de preço no período, aumentando em até 75% no campo e cerca de 20% nos supermercados. Assim como o arroz, a leguminosa registrou redução da área plantada em 1%. Os produtores optaram por ampliar a área plantada com soja diante do cenário externo favorável para a oleaginosa.

Em geral, os alimentos para consumo no domicílio tiveram alta de 1,15% em agosto, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os principais produtos que puxaram o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em agosto foram a elevação nos preços do tomate (12,98%), do leite longa vida (4,84%), das frutas (3,37%), das carnes (3,33%), óleo de soja (9,48%) e arroz (3,08%).

Ainda segundo o IPCA divulgado pelo IBGE, os produtos que tiveram as maiores altas no acumulado do ano até o mês de agosto foram: manga (61,63%), cebola (50,40%), abobrinha (46,87%), peixe tainha (39,99%), limão (36,56%), feijão-macáçar (fradinho) (35,91%), pimentão (33,07%), feijão-mulatinho (32,59%), morango (31,99%), feijão-preto (28,92%), mamão (26,86%), fígado (25,86%), leite longa vida (22,99%), tangerina (22,12%), cenoura (21,61%), batata-doce (19,57%), arroz (19,25%), pera (19,09%), peixe-filhote (19,00%), óleo de soja (18,63%).

 

Pantanal em chamas

Nos últimos meses já vínhamos relatando sobre o desastre em relação às queimadas na Amazônia e no Cerrado. Todavia, chegou a vez do Pantanal entrar em chamas. Segundo levantamento do jornal Estado de São Paulo, a partir de dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), as queimadas de janeiro a agosto deste ano no Pantanal equivale a todas as queimadas dos últimos 6 anos. Os dados dos satélites do Inpe registraram um total de 10.153 focos de incêndios em 2020. O valor é três vezes maior se comparado com o ano anterior; em relação a 2018, o cenário é de um aumento da ordem de 1.700%, quando foram registradas 603 focos.

Uma perícia realizada pelo Centro Integrado Multiagências de Coordenação Operacional do Mato Grosso (Ciman-MT) apontou que a origem destas queimadas é a ação humana. Segundo os laudos, os incêndios se deram principalmente para a limpeza de áreas para a formação de pastagem, fogo em raízes para a retirada de mel de abelhas e incêndios em máquinas agrícolas e veículos. Os laudos foram encaminhados para a delegacia de meio ambiente para a abertura de inquérito.

Até mesmo o ministro do meio ambiente Ricardo Salles admitiu que os incêndios no Pantanal chegaram a proporções gigantescas, e afirmou ainda que haverá um grande prejuízo para a fauna e a flora deste bioma.

Desde o início do ano, já foram consumidas pelas chamas uma área de 23,5 mil Km²; o valor corresponde a cerca de 12% do Pantanal. Segundo o tenente dos bombeiros M. Silva, a perda de controle é tamanha que apenas a chuva seria capaz de sanar os incêndios, já que a baixa umidade e o intenso calor na região faz com que os ventos rapidamente recomecem os focos de fogo a partir de brasas subterrâneas. “Nunca vi isso na minha vida. Estou com 60 anos e sou pantaneiro, sou daqui da região, e nunca vi acontecer uma coisa dessas”, declarou Silva.

Por fim, vale destacar que os dados de focos de incêndios em todos os biomas brasileiros já é superior ao mesmo período de 2019 (1º de janeiro a 14 de setembro). Os 133.974 focos no período já representa um aumento relativo de 13%. Se compararmos os primeiros 14 dias do mês de setembro de 2019 com igual período deste ano, há um aumento de 86%; um salto de 11.003 para 20.485 focos de incêndios. Se não bastasse esse cenário, o vice-presidente Hamilton Mourão afirmou que é alguém da oposição ao governo dentro o Inpe que divulga dados negativos sobre as queimadas no país. Vale avisá-lo que os dados são públicos e atualizados diariamente.